Como cantar harmonias vocais?

Você não pode fazer uma segunda voz? Você gostaria de saber o que é “terça-feira” (como se diz em alguns círculos)? Você acha que os cantores (sertanejos, por exemplo) nascem com esse dom?

Bem, a má notícia para os pessimistas é: se você estudar, será capaz de fazer a segunda voz. Não existe essa história de “nascer” sabendo fazer a segunda voz.

Como seria cantar uma segunda voz?

Em inglês, normalmente dizemos ” cantam harmonias ” e esse termo nos parece muito mais descritivo do que seu equivalente em português. Isso porque uma segunda voz só funcionará bem se estiver seguindo a harmonia (acordes) daquela música específica.

Na verdade, ela funciona quase como um contraponto harmônico ao vocal principal. Em cenários mais simples, uma segunda voz segue mais ou menos o mesmo padrão da voz principal, mas respeitando – e fazendo as adaptações necessárias – o acompanhamento harmônico da música.

Vamos considerar aqui, então, o cenário mais simples possível para uma segunda voz: uma voz principal canta uma melodia simples acompanhada de acordes simples; e só pretendemos fazer uma segunda voz acima ou abaixo dessa voz principal.

Imagine a melodia de “Twinkle, Twinkle Little Star” em dó maior.

A primeira frase dessa música tem essa sequência de notas:

C – C – G – G – G – A – A – G – F – F – E – E – D – D – C

E uma das possíveis harmonizações seria:

C G F C

Twinkle, twinkle little star,

F C G C

Como eu me pergunto o que você é

Há uma escolha que você deve fazer ao preparar uma segunda voz: se ela ficará acima ou abaixo da voz principal. A escolha depende de alguns fatores:

1) O alcance vocal da melodia principal;

2) Seu alcance vocal como cantor de segunda voz;

3) Da harmonia da música;

4) O arranjo que você pensou para essa música.

Sobre extensões vocais

Os dois primeiros pontos são bastante simples. Analise as extensões e veja qual opção não é nem muito baixa nem muito alta para você.

Sobre aspectos harmônicos e de arranjo

Com relação ao terceiro ponto, e conforme mencionado anteriormente, a segunda voz precisa fazer sentido com os acordes da música. Ou seja, não é muito comum haver notas que não pertençam aos acordes acontecendo na segunda voz enquanto aquele acorde específico é tocado.

Isso se aplica principalmente às primeiras e últimas notas das melodias referentes a cada acorde. Muitas vezes temos notas de passagem (às vezes até na voz principal) que se desviam do acorde sobre o qual estão sendo cantadas. A função dessas notas de passagem é exatamente preencher o espaço entre duas notas pertencentes ao acorde e, assim, tornar a melodia mais fluida.

Por exemplo: as duas primeiras notas em nosso exemplo (em que você canta Twinkle, twinkle) são C e C e o acorde tocado quando essas duas notas são cantadas é C Maior. Então, a segunda voz ficaria restrita às outras notas que compõem esse acorde (E ou G).

Há também outro ponto importante: em casos de apenas duas vozes (e novamente em cenários simples), a segunda voz deve privilegiar intervalos harmônicos de terços ou sextos. Quando não é possível usar um terceiro, ele é substituído por um quarto e, quando não é possível usar um sexto, ele é substituído por um quinto.


Ou seja, os intervalos classificados como consonâncias imperfeitas
 são privilegiados . Evite intervalos como segundos ou sétimos. Oitavas e uníssonos geralmente nem são considerados segunda voz (porque são a mesma nota), são considerados duplos ou reforços. As quartas paralelas acima ou as quintas paralelas abaixo ou acima também não são desejadas porque, apesar de terem um pouco mais de informação harmônica, elas ainda funcionam mais como um reforço (como curiosidade, o canto gregoriano em geral se desenvolve com intervalos de quintas paralelas) do que como uma voz independente.

E o que há de errado com os reforços?

Bem, já passamos do ponto de falar sobre o certo e o errado em termos de escolhas musicais, não é mesmo? Mas, na verdade, eles acabam empobrecendo o arranjo porque uma voz é “perdida”. É quase como se não tivéssemos uma primeira e uma segunda voz. No caso dos reforços, temos uma primeira voz com um “pequeno detalhe” extra.

Na prática

Vamos considerar um homem cantando a melodia de “Twinkle, twinkle little star” começando em C2 (uma oitava abaixo do dó médio) e também que outro homem pretende fazer a segunda voz.

Com relação ao alcance vocal, descartaríamos a segunda opção de voz abaixo porque seria muito baixa.

Se essa segunda voz começasse em uma terça acima da primeira nota e continuasse em terças paralelas até o final da frase, teríamos:

Mi – Mi – Si – Si – C – C – Si – Lá – Lá – Sol – Sol – F – F – Mi

No que diz respeito à harmonia e ao arranjo, quase tudo fica dentro de casa também. Os dois únicos desvios que teríamos seriam na sétima nota (Bb), na antepenúltima e na penúltima notas (os dois Fs). Se fizermos dessa forma, estaremos acrescentando uma sétima maior ao acorde de dó (onde se canta “star”) e uma sétima menor ao acorde de sol maior (onde se canta “what you”).

No caso do Si, seria melhor substituí-lo pela manutenção da nota Dó que havia sido cantada anteriormente, que ficaria assim:

Mi – Mi – Si – Si – C – C – C – C – Lá – Lá – Sol – Sol – F – F – Mi

No caso dos dois Fs, é aceitável porque é um acorde dominante que vai para a tônica e esse F acaba resolvendo em E (aprendemos esses conceitos quando estudamos harmonia – se quiser, deixe suas dúvidas nos comentários que escrevemos em outros posts) e também porque é uma música bem simples, com cara de música tradicional; portanto, uma dominante com sétima pode fazer parte desse universo.

Ao mesmo tempo, se quiséssemos evitar essa sensação de sétima dominante, que dá à música uma aparência antiga e “clássica”, poderíamos manter a nota G que a segunda voz estava cantando. Nesse caso, ficaria assim:

Mi – Mi – Si – Si – C – C – C – C – Lá – Lá – Sol – Sol – Sol – Sol – Sol – Mi

Assim, sacrificaríamos um pouco o design da segunda voz e introduziríamos um intervalo de quarta nas terceira e penúltima notas, mas teríamos um visual mais moderno em nosso arranjo.

E se houvesse duas mulheres cantando?

Nesse caso, a voz principal começaria a cantar um C3 (central) e a segunda voz, se estivesse acima, um E3, mas poderíamos seguir exatamente o que dissemos nos parágrafos anteriores.

Por motivos de alcance vocal, poderíamos pensar em uma segunda voz abaixo da principal também. Nesse caso, ficaria assim:

G – G – D – D – F – F – E – C – C – C – C – C – B – B – G

Neste exemplo, optamos por uma segunda voz muito simplificada (que seguiu a voz principal o máximo possível), fazendo apenas algumas adaptações. Observe que optamos por quartas na maior parte da linha da segunda voz porque as terças inferiores acrescentariam muitas notas estranhas aos acordes, mas houve um momento em que voltamos às terças.

De certa forma, o arranjo com a segunda voz inferior foi um pouco mais pobre do que com a segunda voz superior, porque havia menos momentos de 
consonâncias imperfeitas
 . Se fôssemos um pouco mais criativos, teríamos de abrir mão do design original da primeira voz para criar mais momentos de terças e sextas-feiras. Um exemplo:

C – C – B – B – C – C – E – C – C – C – C – C – B – B – C

Esse exemplo teria um arranjo mais interessante, mas talvez um pouco mais difícil de cantar e memorizar.

Primeira voz feminina e segunda voz masculina

Nesse caso, talvez a melhor opção seja a voz feminina começar em C3 (meio) e a segunda voz masculina ficar abaixo da voz principal (começando em E2 ou C3). Nesse caso, podemos seguir o mesmo procedimento explicado para a segunda voz feminina abaixo.

Primeira voz masculina e segunda voz feminina

Aqui, um homem agudo poderia cantar começando em C3 (meio) e a segunda voz feminina acima, seguindo o que dissemos sobre as duas vozes femininas.

Se o homem estivesse falando sério, a segunda voz feminina ainda estaria acima (começando em um E3), mas elas estariam separadas por um intervalo que chamamos de décima (uma terceira oitava acima). Não é muito comum, mas funciona bem.

Como estudar todos esses exemplos?

Como você deve ter percebido, é interessante ter um pouco de conhecimento de teoria, um pouco de harmonia e saber tocar melodias e acordes em um instrumento (os melhores são piano e violão).

Em seguida, crie sua segunda voz (você pode usar nossos exemplos como ponto de partida e, como exercício, vá até o final da música) e cante-a muitas (muitas mesmo) vezes com o acompanhamento dos acordes (ou playback) SEM a primeira 
voz
 . Você precisa afinar muito bem sua segunda voz no acompanhamento e memorizá-la; como se essa voz fosse a mais importante da música. Só então volte a cantar ouvindo a primeira voz.

Se você não fizer isso, pode acontecer o que é muito comum com iniciantes na segunda voz, que é acabar caindo na primeira voz novamente. Ou não conseguir afinar a segunda voz muito bem.

Nesse sentido, o equipamento de gravação pode ajudá-lo muito a estudar, veja nosso outro post: https://www.raphaelbegosso.com/016-equipamentos-para-aulas-de-canto/

Com o equipamento, você pode gravar a primeira voz e cantar e a segunda, você pode se ouvir cantando a segunda voz e, se ainda se confundir entre tocar e cantar, pode gravar o piano ou o violão e estudar apenas o canto. Mesmo até ter certeza, você pode manter o volume da primeira voz bem baixo, apenas como pano de fundo enquanto canta a segunda voz.

Conclusão

Há pessoas que acham fácil e fazem bem a segunda voz sem seguir essas etapas? Sim, mas são exceções. E nunca podemos nos guiar por exceções quando começamos a estudar um assunto, temos de seguir o que já foi testado e comprovado muitas vezes.

Picture of Raphael Begosso

Raphael Begosso

Formado em Música com habilitação em Composição e Regência pela Universidade Estadual Paulista (UNESP), a melhor faculdade de música do Brazil. Como um dos melhores alunos de sua turma, conseguiu uma bolsa da CNPQ e foi convidado para integrar um grupo de pesquisa científica conhecito como PET. Raphael trabalhou como diretor, arranjador, e produtor de muitos grupos vocais e corais. Seu grupo CantaMais fez shows por várias cidades de Sãp Paulo e foi convidado para fazer uma participação num programa de TV chamado Programa do Jô da rede Globo de televisão (você pode achar esse vídeo em nosso canal do YouTube). Ele estuda voz desde 1998 e é um vocal coach dede 2002. Estudou tamabém piano, guitarra, violão erudito e canto coral na Escola de Música do Estado de São Paulo (antiga ULM) Um dos grandes mentores de Raphael é Brett Manning que aplica o Singing Success – método de eficiência comprovada e usado por vários cantores famosos e ganhadores de prêmios Grammy, MCA Awards and Dove comoHayley Williams (Paramore), Taylor Swift, Keith Urban, Mark Kibble and Claude Mcknight (Take 6), Michael Barnes, Luke Bryan entre outros.

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