Então você ouviu de alguém que não tem uma boa voz para cantar? Sem garganta? Antes de mais nada, vamos esclarecer que o ato de cantar envolve três processos:
- Ouça bem;
- Ter uma bagagem cerebral que entenda o que você ouviu e que envie um comando preciso para a musculatura envolvida no canto;
- Finalmente, usar a musculatura para realmente produzir a voz.
Vou fazer uma analogia para ver se podemos aproximar esses conceitos de nossa vida cotidiana. Minha visão pode mirar em um peso de 100 kg a 2 metros de mim. Meu cérebro interpreta essas informações e faz um esboço do processo que eu precisaria para sair da cadeira e levantar esse peso. Meu cérebro também envia comandos ao corpo para que ele finalmente se levante da cadeira, ande 2 metros, se curve e levante o peso.
Mas se meu corpo não estiver treinado para suportar essa carga, não conseguirei ou possivelmente me prejudicarei durante o ato. Quando digo ouvir bem, não me refiro apenas a ter uma audição saudável do ponto de vista médico. Também me refiro a ter um ouvido treinado para diferenciar nuances de notas e timbres.
Por exemplo: ouvir duas notas de 2 e, mesmo sem saber nada sobre teoria musical, saber qual delas é a mais grave. Ou então, ouvir duas vozes e identificar que uma delas é mais nasalizada, etc. Observe que eu fiz questão de mencionar que a pessoa pode ter ou desenvolver essa habilidade mesmo que não saiba nada sobre teoria musical.
Você mesmo que está lendo esta postagem pode ser ou conhecer alguém que nunca estudou teoria musical e que tem essa habilidade. Mas a maioria das pessoas se beneficia de um estudo formal nessa área, mesmo que já tenha alguma facilidade.
Como músico, lembre-se: seu primeiro instrumento é o ouvido. Além de procurar aulas com professores, uma dica é tentar um estudo autônomo por meio do software Ear Master ( www.earmaster.com ). É um software muito completo que vai desde exercícios muito simples até níveis muito complexos de treinamento auditivo; no Brasil, também conhecemos esse assunto como Percepção Musical.
Outra coisa que pode ser feita é, se você já toca um instrumento, tentar tocar de ouvido um trecho da melodia de qualquer música toda semana. Com isso, resolvemos a primeira parte de nossa bagagem cerebral. A segunda parte do conhecimento está especificamente relacionada à técnica vocal. É por isso que uma boa aula de canto não precisa ser muito teórica, mas deve conter informações essenciais para que você saiba o que está fazendo com seu próprio corpo.
Perguntas como o que é, onde e como usar a voz de peito, a voz mista, a voz de cabeça; aqui usarei um pouco mais de ressonância faríngea; preciso usar mais fluxo de ar aqui; mais adiante na música preciso de um pouco mais de compressão etc. Tudo isso deve ser respondido e aprendido durante suas aulas práticas de canto.
Isso é essencial para que você envie um comando preciso ao seu corpo. Por fim, vem a etapa de realmente realizar o ato de cantar. Para isso, você precisa ter treinado muito para ter “força”, resistência, consistência e precisão muscular para que tudo o que seu corpo processou nas etapas anteriores ocorra conforme o planejado.
Após essas etapas, você já tem todas as ferramentas estruturais necessárias, restando apenas questões relacionadas à interpretação e ao estilo. Mas esse é um assunto para outra postagem, fique atento!
Portanto, não caia na ideia de que cantar tem a ver com ter uma boa voz, ter uma garganta, ou que esse é um talento ou dom que somente as “pessoas escolhidas” podem ter. A ciência, a medicina, a fonoaudiologia e a técnica vocal hoje já estão muito avançadas e têm um caminho certo e claro para você aprender a cantar bem.